Seize the day





Mais uma vez em meu quarto escuro, pouco iluminado por luzes externas desconhecidas. O guarda-roupa com aquela porta pouco aberta, sem medo de que algo saia lá de dentro, pois o que me causa medo vem de dentro. É a saudade que tenho de ti. Esse frio e vazio tem se feito presente nesses tempos em que pessoas sofrem incansavelmente por ar, por cura, implorando pelo fim de um mal que nos acomete todos os dias. Todo ser humano carrega consigo um mal a ser solucionado e o meu, é a falta que tenho de ti.
A minha visão é turva desde a última semana, sem qualquer cuidado em um dia deprimido acidentei meus óculos e agora ele se encontra inutilizado, ao mesmo tempo em que sofro de uma alergia à água sanitária e as máscaras caseiras são lavadas com ela, estou reagindo mal a isso. Além de não enxergar direito, minha lembrança de ti vai sumindo aos poucos da memória, juntamente com os momentos em que vivemos juntos. 
Mesmo que a juventude me oferte uma resposta óbvia de que tudo pode ser trazido de volta com facilidade, que a saúde pode ser restaurada, eu sinto cada rua que passo como cada célula do meu sangue passando por entre minhas veias. Elas significam, elas somam, elas tem valor, tem afeto, assim como tu, como nós. Eu não quero que nada desapareça, quero teu abraço de volta, quero voltar a beijar-te a face e percorrer por qualquer que seja o caminho ao teu lado, mesmo que seja para tomar um café fraco ou estranhar uma rua vazia. As ruas, elas vão resistir, nós também precisamos, temos que ter esperança de que tudo vai passar e vamos ficar bem.
Recordo-me de quando nos encontramos pela primeira vez, por mais que fosse um equívoco da vida, de sopetão, uma coisa rápida. Sei que tua imagem ficou em minha mente, até que um bom tempo depois pudéssemos nos ver novamente e realmente nos apresentarmos de verdade e aí sim, oficialmente pertencermos um ao mundo do outro, mesmo que indiretamente. O que eu mais gostaria de pedir-te é que fique. Fique por um tempo, não precisamos medi-lo agora, nem amanhã, nem na próxima semana. Já passamos tanto tempo sem nos ver, praticamente uma vida inteira, uma guerra sanitária que ainda existe e que estamos enfrentando juntos (mesmo que em casas separadas). Por favor, eu sei que isso pode não ser pra sempre, sei que o ser humano tem seus dias contados em algum lugar nesse universo, que o momento de hoje pode não existir amanhã, que é único. Fique. Asseguro-te que minha vida é mortal, que seguir contigo poderá ser mais saudável.
Eu vejo teu sorriso em fotos planejadas e inesperadas, os teus olhos castanhos e expressivos, os quais poderia desenhar com tinta, caneta em gel ou até mesmo lápis de grafite. Contanto que olhasse para ti, para ser meu modelo, para captá-los em sua melhor imagem, eu seguraria em tua face até que minha memória fotográfica pudesse gravar os mínimos detalhes, dos vasos sanguíneos até o nascer dos novos cílios. Sabemos que um dia iremos nos separar, mas enquanto isso, eu quero ter-te em meus braços, encaixar minha cabeça junto ao teu pescoço e sentir teu cheiro, ao mesmo tempo que podes apoiar teu queixo em minha cabeça. Envolta teus braços no meu corpo e eu envolto os meus braços no teu. Eu não vou te deixar.
Não desejo ter lamentos ao fim de tudo, por não ter aproveitado cada momento ao teu lado. Sei que existem momentos frios, hiatos inexplicáveis em meio ao tempo e o espaço onde pessoas padecem e eu não quero ter o que não contar. Já pensou para onde iremos quando tudo acabar? Talvez possamos nos separar e o lugar de nossas vidas será substituído por novas vidas, novas histórias...
Meu amado, não há vida eterna que possamos viver neste plano terrestre. Sem pretextos, segure minha mão e vamos, sem demora. Você iria comigo à uma nova jornada hoje? Você me aceitaria em sua vida para viver contigo até onde os nossos momentos nos deixam ir? Não posso deixar que algo tão forte e eloquente passe por despercebido aos olhos humanos, que as melodias não se igualem às nossas risadas, que o nosso semblante enamorado não seja registrado. Nós merecemos viver isso. Nós merecemos sentir isso. Então, antes que eu não possa beijar teus lábios, vamos aproveitar o dia antes que as lamentações cheguem até nós. O frio é intragável sem teus abraços, somos dignos que nosso romance seja real. Por favor, ligue-me e conte-me que está vindo. 
Vidas perguntam sobre as nossas e o que eu posso dizer? Que careço dos teus beijos, abraços, que nossas recordações mantenham-se vivas e que nós também estejamos para fazermos mais delas. Não sofra, meu amado, eu estou aqui esperando-te porque sei que vens. Tens coragem que eu te amparo, que eu te seguro, que eu te entendo, que a gente aprende, que a gente se entende e que a gente constrói o que puder ser construído, no melhor que puder ser. Não precisas ter vergonha, tu não ficarás sozinho, não me afastarei de ti, te quero por perto e aceito teus apegos.
Não é pelo mundo, não é pelo ego, não é pela carne. É por nós.
Por mais um dia e por outro mais.

Assinado, Joice.
(Obrigada, M. Shadows)

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