Traumas e aconchego
Certo dia eu estava conversando com uma pessoa que acabara de conhecer. Meu terceiro olho sinalizou que essa pessoa poderia ser confiável para contar sobre um trauma que me atormenta desde a infância. Meu pai é alcoólatra e talvez não convenha eu falar sobre uma particularidade tão pessoal minha num blog, mas acredito que tem tantas outras garotas como eu que passam pela mesma situação e necessito encorajar elas e outras pessoas a enfrentarem isso.
Essa pessoa que declarei essa minha ferida interna recebeu bem essa informação, a princípio. Entretanto, em alguns dias parou de conversar comigo. Não sei se foi algum tipo de apatia ou problema pessoal, mas no momento me senti uma idiota, enganada e talvez errada por compartilhar isso com alguém. No ato, minha intenção era apontar à tal que todos nós somos seres humanos, que temos nossos traumas, lembranças que nos doem na alma mas que nos fizeram crescer, fazendo com que tomássemos decisões importantes na vida como sair de casa e querer um futuro diferente. É uma pena que talvez essa pessoa não tenha pensado exatamente nesse lado e sim ter levado pro lado pessoal dela, porque disse que gosta de beber, então provavelmente não teríamos como um dia "paquerar".
Tenho que confessar, mesmo que isso tenha acontecido, me senti acolhida por essa pessoa. Senti aconchego em um momento que menos esperei e ao mesmo tempo que o fato dessa pessoa me dizer que gosta de beber me fez lembrar do meu pai, me abriu uma lacuna na mente: Eu também curto beber, não exageradamente como uma pessoa alcoólatra (como meu pai), sei meus limites, sei aproveitar o momento, sei me divertir ao meu modo com ou sem a bebida e principalmente, com o comportamento das pessoas que eu gosto, independente delas beberem, fumarem ou nenhum dos dois.
Isso me fez perceber que muitas vezes eu idealizei pessoas que não existem; que listei características de pessoas para manter relacionamento que praticamente não compõem totalmente uma pessoa. Vai ter sempre alguém com algo que eu não vou ser totalmente a favor, da mesma forma que eu tenho costumes que alguém não ache totalmente perfeito ou que convenha eu praticar hoje em dia, porque o mundo tá "moderno" demais. Em resumo, todos nós somos diferentes, talvez nunca concordemos 100% um com o outro, mas existem equilíbrios, sintonias onde nós nos estabelecemos e conhecemos outras pessoas que somam à nossa caminhada. Cada indivíduo nos traz aprendizado quando passa por nosso caminho, seja lá que caminho seja esse que estamos trilhando... Não sei se essa pessoa simplesmente passou, se vai permanecer, se vamos nos reencontrar, se eu ter confidenciado à ela uma dor pessoal foi um filtro pra que ela se distanciasse de mim, mas ainda assim foi um aconchego em que senti. Me senti abraçada mesmo que de longe, porque as palavras dessa pessoa, por dias, me deram um aninho, me deram paz, me fizeram bem e integraram-se aos meus dias como algo bom.
A nossa existência é composta disso, de traumas, aconchegos, aprendizados, as vezes uma pitada de sentimentos de depreciação (o que eu acho triste), contudo isso nos fortalece e acredito que essa é a função de tais pingos de sentimentos. Foram eles que criaram o que eu sou hoje, a Joice revigorada, mais madura, consciente dos próprios sentimentos e ações, que ora são de iniciativa, ora são temerosas por medo de alguém interpretar mal, contudo sempre tentando manter a determinação que aprendi a ter.
Anseio que cada pessoa que ler isso, possa se sentir abraçada agora, aconchegada. E dizer que seus traumas são acolhidos por mim, que isso pode ser revertido por momentos felizes. É só questão de tempo.
Assinado, Joice.
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